O fenômeno religioso
divide-se em duas partes, prevalecendo uma visão dualista: o sagrado e o
profano. Émile Durkheim observa que: “existe
religião tão logo o sagrado se distingue do profano.” Nesse sentido,
considera-se sagrado tudo aquilo que está ligado à religião, magia, mitos,
crenças. Profano é aquilo que atribuímos como sinônimo de mundano, cotidiano ou
rotineiro. Sagrado pertence a Deus. Profano pertence ao mundo. O homem
religioso, para entrar em contato com o divino, retalha a vida no mundo profano
– gestos, pessoas, espaços e tempos.
Na perspectiva da tradição cristã, segundo o Ed René
Kivitz, “o sagrado é aquilo que expressa a presença divina. É compatível com o caráter
de Deus e tem haver com os propósitos desse Deus que está em missão. Comer
pizza é sagrado, desde que esse comer pizza esteja embutido nos propósitos, no caráter
do Deus a quem servirmos. O sagrado se manifesta
para além do ambiente religioso e que no mundo, que chamamos de secular há
muita expressão do sagrado.”
O
importante a ser ressaltado é que o conceito cristão de sagrado extrapola o que
é meramente religioso. O sagrado não são apenas símbolos, pessoas, coisas, mas
o sagrado é toda a criação divina. Toda a criação divina foi feita para cultuar
ou glorificar o Eterno. O Ariovaldo Ramos diz: “Se alguém faz alguma coisa e o
que ele faz não pode oferecer isso como culto, ele profanou o universo. Por que
o universo foi feito para culto de Deus.”
A
criação é boa, como está escrito em Gn 1: 12,21,25. Todas as coisas, nos céus e
sobre a terra foram criadas nele (Cl 1:16). Até o trabalho em 1
Tessalonicenses, capítulo 4, versos 11 e 12, está inserido em assuntos
espirituais.
Conclui-se
que, parafraseando o apóstolo Paulo em 1 Co 10:31: quer comais, quer bebais, quer
façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória da Deus. Há uma superação do dualismo sagrado e profano
que muitas vezes está inserido nos discursos das igrejas cristãs.
Entendido
isso, partimos para o conceito de adoração, a saber, render culto à uma
divindade. Adoração, já foi confundida com conceitos românticos, e em se
tratando de Brasil em meados dos anos 90 e 2000. Adoração, na época – e existe
esse ranço até os dias de hoje – era conceituada como aquele momento de êxtase amparado
por alguma expressão artística, geralmente a música ou a dança.
Após
isso, houve uma tentativa a superação desse conceito, agora adoração não era
mais o momento de êxtase amparado por expressões artísticas, mas sim um estilo
de vida. Porém essa perspectiva sobre estilo de vida ampliou o conceito de
adoração com o ranço do dualismo sagrado e profano. O estilo de vida é
conceituado equiparando-se com a “oração incessante”, ou seja, vou à faculdade,
então no caminho estou em “espírito de oração”, me conectando com Deus de
alguma forma, porém dando margem a perda dessa conexão em algum momento do
espaço/tempo. Nesse contexto existe um
reducionismo do conceito da adoração.
“A dicotomia
sagrado/secular valoriza uma adoração estética, voltada em manifestações
vocais, corporais e rítmicas; ligada a um espaço físico. Hoje muito se fala em louvor e adoração, porém ligada a uma
estética, uma inovadora fórmula. Biblicamente falando, a adoração não está
presa a música ou outras manifestações vocais e rítmicas. Adoração é um estilo
de vida, é mais do que música, culto e instrumentos musicais, é uma forma de
viver, em todas as áreas da vida. Enquanto se adora com instrumentos, se deixa
de louvar com testemunho público no pagamento de imposto. Essa dicotomia leva a
drásticas consequências na vida cristã.” (Gutierres Siqueira)
É preciso
ultrapassar esses antigos paradigmas sobre adoração e levantar outro entendendo
que todas as coisas foram feitas para a glória de Deus; entendendo que cada
pessoa é um sacerdote (1 Pe 2:9); entendendo que somos sacrifícios vivos (Rm
12:1). Logo não há como separar alguma atividade sem que essa atividade seja
adoração a Deus. É impossível eu ser sacerdote real apenas quando estou cercado
pelos símbolos ou locais religiosos. É impossível pensar em uma adoração que em
algum momento do espaço/tempo possa ser desconectada do Eterno. A adoração torna-se integral quando entendemos
essa perspectiva. Rendemos culto a Deus em todo o momento, fazendo qualquer
coisa, seja intrapessoal ou interpessoal.